O Brasil registrou 225.675 alertas de desmatamento entre janeiro de 2019 e dezembro de 2021. Desses, 98% tinham índices de ilegalidade e apenas 7% deles foram alvo de alguma ação. Os números, obtidos através de um levantamento realizado e lançado pela rede Mapbiomas, mostram que boa parte das advertências estão concentradas na Amazônia: o conglomerado possui 155.531 notificações, correspondendo a cerca de 77,7% do total nacional no mesmo período analisado. As dificuldades de fiscalização, de acordo com pesquisadores do estudo, estão ligadas aos desafios de acesso à região e, principalmente, ao privilégio dado para práticas presenciais.
Neste cenário, o Pará se destaca como o estado do bioma que mais tem casos de alerta de desmatamento: foram 62.558 comunicados. A solução para a falta de um controle de qualidade passa pelo uso adequado e urgente das tecnologias que já estão ao dispor, como os satélites, que permitem a identificação da retirada da vegetação nativa com imagens de alta resolução. Assim, o embargo remoto, uma medida administrativa que bloqueia de forma imediata o uso econômico das áreas desmatadas e defendida pelo Mapbiomas, é uma alternativa viável e estratégica para o atual contexto em que a derrubada das florestas segue ganhando índices elevados.
Neste ano, a área recoberta por alertas de desmatamento foi de 471 quilômetros quadrados (km²), enquanto em 2021 foi de 554 km²
A Amazônia somou mais de 2,6 milhões de hectares destruídos. Por isso, aliar a tecnologia ao combate dos crimes ambientais é reconhecido com uma solução eficiente. André Lima, consultor sênior de Política e Direito do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), parceiro do Mapbiomas, explica que, além disso, as faltas de recursos também compõem o panorama. “Isso acaba que não atende a grande maioria dos alertas. Assim, a gente está propondo a estratégia do embargo remoto em escala, porque nós não vamos fazer a fiscalização e responsabilização do desmatamento ilegal de forma presencial, precisamos e é inadiável que seja feita usando as ferramentas de controle remoto”, afirma.
Isso porque, no caso da Amazônia e as dimensões continentais que possui, as dificuldades de acesso ganham notoriedade quando o assunto é o controle das áreas de floresta desmatada. “Os satélites chegam em um escala de quase um para um, então, a gente tem tecnologia. O STJ [Superior Tribunal de Justiça] já decidiu, inclusive, em face de ações movidas no Pará, que é possível e admissível juridicamente o uso dessas imagens e laudos virtuais de comprovação de infrações e danos ambientais. Há, ainda, a possibilidade de a gente usar mecanismos virtuais para notificar infratores. Toda a legislação que existe é suficiente para que os estados tenham um controle mais inteligente”, diz André.
Junto com o fator dificuldade, os danos que as operações presenciais de combate aos prejuízos ambientais causam chegam aos bolsos do estado. “Se nós queremos alcançar o desmatamento zero na Amazônia ou em qualquer bioma que não passe necessariamente por usar meios e caminhos tecnológicos para a responsabilização jurídica, administrativa e penal por esses crimes, não adianta insistir no sistema tradicional de controle. Não vai resolver. O aumento brutal do desmatamento já indica que a gente tem que mudar de estratégia e, para isso, é preciso ter vontade política, tanto federal, quanto estadual”, destaca o especialista.
Recentemente, durante a COP 27, realizada na cidade de Sharm El Sheikh, no Egito, o presidente eleito do Brasil, Luís Inácio ‘Lula’ da Silva, expressou a vontade de trazer o evento - a COP 30 - ao país em 2025 e ter a região amazônica como sede. André estima que para que a área esteja em “boa forma”, cerca de 80% do desmatamento precisa ser reduzido. “Então, temos mais ou menos um ano para implementar uma nova estratégia, desenvolver, renovar e atualizar essa estratégia, e dois anos para reduzir significativamente o desmatamento. Eu diria que o Brasil precisa reduzir em 80% essa taxa para que a gente consiga sedir a COP”, finaliza.
Entenda o que é o embargo remoto
A proposta foi lançada no Guia de Boas Práticas, desenvolvido pelo Mapbiomas. A ação congela os bens econômicos que os proprietários ou posseiros venham a ter com o desmatamento ilegal. E, mais: os responsáveis não conseguem ter acesso a créditos rurais de regularização ambiental ou fundiária e vão ter restrições no mercado de produtos agropecuários e florestais.
Fonte: Camila Azevedo/OLiberal