Os investimentos nas universidades federais brasileiras entre 2022 e 2021 foram os menores dos últimos 22 anos, diz o painel Financiamento da Ciência e Tecnologia, elaborado pelo Centro de Estudos Sociedade, Universidade e Ciência, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) é um termômetro da situação das instituições do Norte: somou o menor valor para 2022 entre todas as 69 instituições de ensino federais brasileiras. Essa instituição liquidou, em 2022, apenas R$ 25.238,10.
O estudo refere-se ao período de 2000 a 2022, com valores atualizados para janeiro de 2023, e recursos contemplando obras de infraestrutura, melhoramentos e compra de equipamentos para pesquisa e aulas, e mostra que, no Pará, "a soma dos orçamentos das instituições cresceu 162% entre 2000 e 2019. Com quedas sucessivas a partir daí, chegou ao ano passado com perdas de 15%. Os dados constam do painel Financiamento da Ciência e Tecnologia, elaborado pelo Centro Sou Ciência, da Unifesp. As informações são da Redação e da Agência Brasil.
O levantamento indica que, em 2021, as verbas destinadas a investimentos nas 69 instituições de ensino federais totalizaram R$ 131,6 milhões – a menor quantia anual investida nas universidades desde o ano 2000. Em 2022, foram R$ 188,7 milhões – o segundo menor montante anual de recursos investidos nas universidades públicas federais, desde 2000. O terceiro ano com a menor quantidade de investimentos, a exemplo dos outros dois, ocorreu em 2019, quando foram investidos 194,6 milhões.
O quarto pior ano em investimentos foi 2002, quando havia 45 universidades federais no país. De acordo com a coordenadora do Sou Ciência e reitora da Unifesp de 2013 a 2021, a professora Soraya Smaili, o recuo dos investimentos nos últimos anos prejudicou a área de pesquisa das universidades e parte da sociedade que se beneficia das instituições.
“Nós certamente deixamos de fazer muitas pesquisas, deixamos de fazer muito ensino, de atender mais nos nossos hospitais, de atender mais nos nossos projetos sociais, nos projetos de extensão. Toda aquela capacidade instalada que as universidades têm, de atender tanto no ensino, de formar pessoas, de produzir pesquisa, produzir conhecimento, nós certamente perdemos muito”, declara Soraya Smaili.
Como ressalta a professora, as universidades federais estão atualmente com centenas de obras paradas e com problemas graves em suas infraestruturas.
“As universidades têm dificuldades hoje, a partir do que aconteceu nos últimos anos, de completar as obras que estavam paradas e também de ter recuperação da infraestrutura para a realização de ensino, pesquisa e extensão”, destaca. Soraya Smaili observa que se trata de obras [paradas] de acessibilidade nos prédios, falta de manutenção de equipamentos, compra de equipamentos novos para realização de pesquisas, compra de livros que também são importantes, e que só podem ser comprados com os recursos de investimento. "Mas, basicamente, o que mais foi impactado quando falamos nos recursos de investimento foram as obras”, completa.
No período de 2000 a 2022, os quatro anos com os maiores valores de investimento nas universidades públicas federais ocorreram em 2014 (R$ 1,5 bilhão), 2013 (R$ 1,2 bilhão), 2011 (R$ 1,19 bilhão) e 2012 (R$ 1,12 bilhão).
No Pará
De acordo com a análise no levantamento do Sou Ciência, os dados de liquidação de recursos de investimento da Universidade Federal do Pará (UFPA) podem ser apresentados considerando dois diferentes momentos. Embora bastante irregular, entre 2000 e 2013 há uma tendência geral de crescimento. No ano 2000, a instituição liquidou R$ 3,4 milhões em recursos de investimento; e, em 2013, após uma alta de 1.474%, a UFPA liquidou R$ 53,534 milhões. Após 2013, há uma inversão dessa tendência; e, entre 2014 e 2016 a UFPA liquidou, em média, R$ 34,537 milhões/ano.
Nos períodos seguintes a restrição orçamentária foi agravada, e entre 2017 e 2018, a instituição liquidou em média R$ 10,931 milhões/ano. entre 2019 e 2022, a UFPA liquidou, em média, R$ 5,441 milhões/ano.UFRANo que se refere à Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), o estudo indica que os dados relacionados à liquidação dessa instituição em ações de investimento podem ser divididos em três diferentes momentos. Entre 2000 e 2011 observa-se um crescimento constante, embora lento, e a instituição conclui este período liquidando R$ 2,797 milhões em 2011.
A partir de 2012 houve uma ampliação dos recursos liquidados em ações de investimento, e entre 2012 e 2014, a UFRA liquidou, em média, R$ 11,381 milhões. A partir de 2015 é possível identificar uma forte redução orçamentária; e entre 2015 e 2018, a instituição liquidou, em média, R$ 1,713 milhões.A partir de 2019, as perdas orçamentárias foram agravadas, e durante o último ciclo de governo, entre 2019 e 2022, a instituição liquidou, em média, R$ 269 mil/ano. "Importante registrar que em 2022, último ano da série histórica, a UFRA liquidou apenas R$ 25.238,10, o menor valor para o ano considerando todas as Universidades Federais brasileiras", como pontuado no levantamento do Sou Ciência.
A série histórica de recursos liquidados com ações de investimento pela Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) começa em 2010, quando a instituição liquidou R$ 3,548 milhões. Os dados apresentam grande variabilidade com picos de investimento em 2013 (R$ 17,177 milhões) e 2020 (R$ 12,103 milhões), seguido de “vales” em 2016 (R$ 410 mil) e 2021 (976 mil). Em média, a instituição liquidou R$ 5,109 milhões/ano em ações de investimento.
O levantamento informa que a série histórica de recursos liquidados com ações de investimento pela Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) começa em 2014 e pode ser dividida em dois diferentes momentos. Entre 2014 e 2017, a instituição liquidou, em média, R$ 11,937 milhões/ano. Em 2018, houve uma queda de -76% em relação ao ano anterior, e a Unifesspa liquidou 2,884 milhões em ações de investimento. A partir desse ponto, a tendência de queda foi mantida, e, entre 2019 e 2022, a instituição liquidou, em média, R$ 2,396 milhões/ano.
A Reportagem Integrada do Grupo Liberal contatou com a UFPA, UFRA, Ufopa e Unifesspa acerca do assunto, nesta quinta-feira (23). Apenas a Ufopa se manifestou sobre o levantamento do Sou Ciência. A reitora da Ufopa, Aldenize Ruela Xavier, destacou que é preciso analisar de maneira separada os orçamentos obrigatórios (folha de pagamento) e discricionários (custeio da instituição).Sobre aumento de recursos para folha de pagamento de servidores, a reitora pontua: “Quanto a Ufopa, uma Universidade em expansão, é de se esperar um crescimento do orçamento de folha expressivo. Como de fato ocorreu.
Dos R$ 133 milhões em 2016 para R$ 172 milhões em 2021. No entanto, cabe destacar, que a Universidade não tem qualquer ingerência sobre esses valores, e o acréscimo corresponde a contratação adicional de servidores, necessário para nossa expansão, bem como as progressões de carreira naturais”.Já sobre o decréscimo de orçamento para custeio da instituição e assistência estudantil, Aldenize Xavier observa: “Por outro lado, vamos considerar os orçamentos discricionários de custeio, que pagam desde auxílios para estudantes, materiais para pesquisa, até nossa conta de luz e contratos de terceirizados. É possível notar um decréscimo de orçamento, da ordem de R$64 milhões em 2016, para R$44 milhões em 2021”, afirma.
“Essa redução expressiva significa o estrangulamento de todas as contas necessárias para o funcionamento acadêmico e administrativo da instituição”.Recursos totaisAlém dos números em investimentos nas universidades federais do Brasil, o painel levantou os recursos executados em despesas correntes (gastos com serviços e materiais essenciais para o funcionamento das universidades, como água e energia elétrica), folha de pagamento e assistência estudantil.
Considerando o total desses recursos, os orçamentos das universidades federais somaram, no ano 2000, R$ 28,2 bilhões. Nos anos seguintes, com algumas oscilações, os orçamentos subiram, em 2019, para R$ 62,2 bilhões. Contudo, caíram em 2022 para R$ 53,2 bilhões, praticamente igualando os valores despendidos em 2013: R$ 53,9 bilhões.
Outras despesas
Em números absolutos, o ponto mais alto dos dispêndios em despesas correntes se deu em 2013, com R$ 9,6 bilhões. O ponto mais baixo foi em 2021: R$ 5,6 bilhões – valor que representa um retorno a 2009, quando foram gastos R$ 5,2 bilhões.Na folha de pagamento, na categoria pessoal ativo, os orçamentos tiveram oscilação menor do que nos outros itens. Seguindo o crescimento das folhas de pagamento verificado desde 2001, o pico registrado foi em 2019, com R$ 52,7 bilhões. Porém, em 2022, voltou ao mesmo dispêndio de 2014: R$ 46 bilhões.
Acompanhando a criação da Lei de Cotas, de 2012, e de outras iniciativas das universidades para inclusão de alunos economicamente carentes e de minorias sociais, os valores aportados em “assistência ao estudante” chegaram ao pico em 2016, com total de R$ 1,13 bilhão. Em 2019, R$ 1,1 bilhão foram destinados à assistência estudantil; em 2022, foram R$ 844 milhões, mesmo patamar de 2013, quando foram gastos R$ 902 milhões.
O painel Financiamento da Ciência e Tecnologia foi lançado nessa terça-feira (21) e pode ser acessado no site da Unifesp.Trajetória paraense indica ganhos e perdas no ParáO Painel mostra elevação e queda de recursos nas universidades federais no Pará, de 2000 a 2022. Pelos dados levantados pelo Sou Ciência, entre os anos de 1934 e 1999 o governo federal criou apenas uma universidade no Pará: a UFPA. Neste século foram criadas três: a UFRA, em 2002; a UFOPA, em 2009; e a Unifesspa, em 2013.
"Do ponto de vista financeiro, entre os anos 2000 e 2019 o conjunto do orçamento delas cresceu 162%, passando de R$ 950 milhões para R$ 2,486 bilhões. Mas entre 2020 e 2022 houve uma queda de 14%, chegando no ano passado a R$ 2,134 bilhões. Valor equivalente a esse é encontrado somente em 2014, quando o governo federal aportou R$ 2,14 bilhões em suas quatro universidades no Pará", é apontado no estudo. Em nível nacional, houve movimentos semelhantes.
As 40 universidades em 1999 passaram para 69 em 2019 – crescimento de 73%. O montante destinado a elas subiu de R$ 28,2 bilhões em 2000 e atingiu o pico de R$ 61,2 bilhões em 2019 – aumento de 116%. Porém, em 2022 regrediu para R$ 53,2 bilhões – queda de 14%. Com isso, houve um retorno a valores inferiores a 2013 (R$ 54,9 bi), com um agravante: há dez anos eram 63 universidades federais – seis a menos do que no ano passado.
“Com seu grande crescimento, o sistema universitário federal se tornou mais suscetível às políticas governamentais para o setor”, analisa a professora Soraya Smaili, ex-reitora da Unifesp e coordenadora do Centro de Estudos Sociedade, Universidade e Ciência (Sou Ciência), vinculado a essa universidade.
O Painel, com dados coletados no Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento, SIOP, do Ministério do Planejamento, apresenta os orçamentos do conjunto das 69 universidades e também de cada uma delas, individualmente, em quatro tópicos: despesas de manutenção e funcionamento; investimento em infraestrutura e material permanente; pessoal; e assistência ao estudante.Empatado com Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco, o Pará é o terceiro com maior número de universidades federais: quatro.
Minas Gerais é o primeiro, com 11.InvestimentosO movimento de ascensão e queda nos aportes do governo federal nas universidades do Pará e do país ocorreu em todos os setores de seus orçamentos. O item “investimentos”, em que estão obras e compra de equipamentos para aulas e pesquisas, foi o que registrou maior oscilação. Em 2022, foi investido o menor valor desde 2002: R$ 5,3 milhões. Antes disso, o ‘recorde negativo’ fora registrado em 2001: R$ 2,5 milhões. Considere-se, ainda, que em 2001 havia três universidades a menos do que hoje.
O pico dos investimentos foi em 2013: R$ 83 milhões.O item “despesas correntes” contempla gastos com serviços e materiais essenciais para o funcionamento das universidades, como água, energia elétrica, internet, tinta para impressora, papel higiênico, combustíveis, vigilância etc. “Também aqui houve um movimento de elevação dos orçamentos, acompanhando o crescimento do sistema, e depois de redução, marcando o período de contínua deterioração física de nossas universidades”, explica a professora Soraya.
Em números absolutos, o ponto mais alto dos dispêndios em despesas correntes no Pará foi em 2015, com R$ 420 milhões. O ponto mais baixo dos últimos onze anos foi em 2021: R$ 259 milhões – R$ 11 milhões a menos do que o aportado em 2011. Folha de pagamentoPara o pagamento de salários e encargos a professores e funcionários técnicos e administrativos, os orçamentos tiveram oscilação menor do que nos outros itens, mas, novamente, houve retrocessos. Seguindo o crescimento das folhas de pagamento verificado desde 2001, o pico registrado foi em 2020, com R$ 2,04 bilhões.
Porém, em 2022 registrou um dispêndio de R$ 1,8 bilhão – R$ 100 milhões a menos do que em 2017.Mais inclusão – Acompanhando a criação da Lei de Cotas, de 2012, e de outras iniciativas das universidades para inclusão de alunos economicamente carentes e de minorias sociais, os valores aportados no item “assistência ao estudante” se iniciaram no Pará em 2009, e chegou ao pico de R$ 58 milhões em 2016. Todavia, em 2021, esse valor foi reduzido para R$ 32 milhões – um retorno ao montante despendido em 2012.A ex-reitora da Unifesp destaca a importância da assistência estudantil para a permanência de estudantes mais vulneráveis, incluindo cotistas e não cotistas.
“As políticas de inclusão no ensino superior precisam ser acompanhadas de políticas de manutenção dos estudantes na universidade”, diz Soraya.O que diz a UFRAEm resposta a análise dos dados relacionados à liquidação da Ufra, informamos que diante do orçamento aprovado no período de 2020 a 2022, esta universidade sempre apresentou o percentual de execução orçamentária acima de 90%, ou seja, otimizou ao máximo o recurso disponibilizado, evitando a devolução de recurso, que é o único cenário que impactaria negativamente para a instituição em caso de repasse de recursos futuros.
Logo, apesar de apresentar um percentual de liquidação em 2022 no valor de R$ 31.210,38 (trinta e um mil, duzentos e dez reais e trinta e oito centavos), o recurso sancionado em 2022 para investimentos foi todo empenhado em aquisição de equipamentos e obras (inclusive em obras paralisadas e que foram retomadas) que a execução iniciou apenas no exercício de 2023.
Fonte: Eduardo Rocha/OLiberal